terça-feira, 15 de fevereiro de 2011



Projeto de lei do governo congela salários dos servidores federais por dez anos, além de estabelecer limites para gastos em obras públicas.

O Governo Federal pode acabar por dar um tiro no próprio pé. O Projeto de Lei Complementar 549 (PLP), que tramita na Câmara dos Deputados, pode inviabilizar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), da Copa-2014, das Olimpíadas-2016 e, o mais grave, fragilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), pilar da boa gestão pública brasileira.

Entidades que representam os servidores públicos dos Poderes Legislativos e Tribunais de Contas do Brasil, como a Confelegis, Fenastc, Fenale, Fenalegis e Sindilegis, argumentam que o novo limite de gasto pessoal nos termos propostos mal absorverá o crescimento vegetativo da folha de pagamento, afetando, consideravelmente, a reposição de servidores estruturados em carreira e a qualidade do serviço público.

De acordo com a segunda vice-presidente do Sindilegis, Lucieni Pereira, o Relatório Consolidado de Gestão Fiscal, de 2009, registra que o gasto com pessoal da União atingiu 31,33% da receita corrente líquida (RCL) federal, resultado que se demonstra estável em relação ao apurado em 2002 (31,88%), e bem abaixo do limite máximo de 50% fixado pela LRF para a esfera federal.

Estados e Municípios, muitos acima do limite de pessoal, não serão atingidos pelo novo limite proposto, o que evidencia um contra-senso sob o ângulo fiscal.Embora possa não ser a intenção dosa idealizadores da inovação, o novo limite de pessoal proposto apenas para a União produzirá reflexos diretos no Poder Judiciário, no Ministério Público e no Tribunal de Contas dos Estados, já que os subsídios dos Desembargadores dos Tribunais de Justiça (TJ) e membros dos Ministérios Públicos estaduais correspondem a 90,25% do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

O Distrito Federal, cujas polícias, corpo de bombeiros, Poder Judiciário e Ministério Público são organizados e mantidos pela União, também ficará de fora do novo limite para controle da despesa com pessoal, criando assimetria descabida em relação à Polícia Federal e aos demais Poderes e órgãos dos Estados.

Nessas bases, a medida, se aprovada, poderá provocar desequilíbrio entre os Poderes estaduais, visto que os servidores do Poder Executivo poderão ser beneficiados com planos de carreira e reposição de aposentados e servidores falecidos no período de dez anos, enquanto o Judiciário, o Ministério Público e o Tribunal de Contas estaduais ficarão com a remuneração praticamente congelada por conta do "teto e subteto constitucionais", quase sem possibilidade de reposição dos cargos vagos, o que comprometerá a prestação dos serviços públicos a cargo desses órgãos tão essenciais para a JUSTIÇA SOCIAL.

De acordo com o texto técnico de autoria da segunda vice-presidente do Sindilegis, encaminhado em dezembro de 2010 aos Presidentes do TCU, do CNJ, CNMP e ao Procurador-Geral da República, além de parlamentares, a previsão de limite para obras públicas associado à realização de despesas correntes (pessoal) é medida desprovida de lógica e razoabilidade jurídica, podendo resultar na morosidade da execução dos investimentos, com grave proliferação de obras inacabadas, o que compromete o início de novos investimentos, tais como estradas, hospitais, escolas, estádios, infra-estrutura em transporte, etc., tendo em vista a restrição prevista na própria LRF.

Essa limitação pode comprometer, ainda, a construção das sedes dos Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público e, futuramente, a do Conselho Nacional dos Tribunais de Contas (CNTC), órgãos autônomos criados constitucionalmente.No plano orçamentário-financeiro, o contra-senso do referido limite não é menor, podendo inviabilizar a implementação de projetos essenciais para a realização da Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016 a cargo de Estados e Municípios, cujos investimentos devem ocorrer em curto espaço de tempo, sob pena de o Brasil não conseguir cumprir a agenda assumida no plano interno e internacional.

"Limitar obras públicas à despesa de pessoal é um absurdo fiscal sem precedente. Enquanto a despesa com pessoal do Poder e órgão está umbilicalmente relacionada à receita corrente líquida do ente da Federação, as obras públicas, em geral, são custeadas com receitas de capital provenientes de operações de crédito e transferências de capital, parâmetros econômico-contábeis que não guardam nenhuma relação entre si", alerta Lucieni Pereira.

Para a segunda vice-presidente do Sindilegis, que há dez anos ministra aulas sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal, a mudança proposta pelo PLP também traz em sua concepção enormes obstáculos no plano operacional, como, por exemplo, o controle segregado das despesas com contratação de pessoal para substituição de terceirizados e os aumentos concedidos até 2009, os quais devem ser excluídos quando da apuração dos limites.

"Como a despesa é registrada em sistemas eletrônicos corporativos mantidos por cada ente da Federação (Siafi e Siafem), conforme padrão de classificação orçamentário-contábil, a separação das despesas de pessoal que devem ou não ser consideradas no cálculo do limite não se processa facilmente na execução, tampouco na atividade de controle externo e social. Alterar a LRF exige as habilidades necessárias para jogar "pega-varetas": requer senso de equilíbrio e de precisão", afirma Lucieni.Em entrevista concedida à Imprensa do Sindilegis (2010), o Ministro-Substituto do TCU, Wéder de Oliveira, também destaca que a mudança radical proposta pelo PLP 549 é de difícil operacionalização.

Relembra que o artigo 169 da Constituição já estabelece um modelo para controlar o aumento da despesa com pessoal, mediante a fixação de limites em lei complementar, o que já existe na LRF, autorização específica na LDO e existência de dotação orçamentária prévia e suficiente. Na visão do Ministro, "pode-se pensar em melhorar a aplicação da Carta Magna, buscando tornar esse controle mais efetivo, transparente e adaptável às situações conjunturais, antes de optar por medidas mais radicais que sofrem justificadas resistências e questionamentos jurídicos.

"Em complemento às considerações do Ministro do TCU, Lucieni esclarece que há outros projetos de lei complementar em tramitação no Senado Federal (como os de nºs 229 e 248, ambos de 2009) para tornar os controles vigentes mais transparentes e efetivos, visando à consolidação da gestão fiscal responsável no Brasil e conclui que o "PLP 549 não contribuirá, em nada, para o fortalecimento da LRF, podendo, pelo contrário, constituir fator de pressões políticas para que seja abrandada a sua exigência, fragilizando o Estatuto Fiscal em seu conjunto, em face dos precedentes que serão abertos com o seu inevitável descumprimento.

"Com vistas a defender os direitos dos servidores e a qualidade do serviço público, o Sindilegis, as Federações das carreiras do legislativo e controle externo, a Confelegis, o Andes, a Fasubra e diversas outras entidades representativas, reuniram-se na última quarta-feira (9) e traçaram os detalhes da MARCHA NACIONAL que se dirige a Brasília, dia 16 de fevereiro, para a realização de um grande protesto na Esplanada dos Ministérios contra o PLP 549 e a MP 520, que congela salários federais e inaugura a privataria nos hospitais universitários e hospitais públicos federais, respectivamente.

Arte: Ada Suene

Fonte: http: //www.sindilegis.org.br

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